quarta-feira, 16 de maio de 2012

E quem pagará para limpar a imagem de Jesus?



Ontem a UOL publicou que a Benetton encerrou a disputa com o Vaticano, através de uma “gorda” doação para uma instituição de caridade católica, cujas cifras não foram divulgadas. Tudo em decorrência da foto em que o papa Bento XVI aparece beijando a boca de um imã, que gerou polêmica entre religiosos e não religiosos.
Realmente, acredito que não ser politicamente correto expor pessoas públicas sem autorização, especialmente uma liderança religiosa como o Papa.
Mas se a gorda doação feita pela Benetton gerou uma certa vitória moral, que veio a limpar a imagem do catolicismo, em dias tão difíceis, eu me pergunto, quem se habilitaria a pagar para limpar a imagem de Jesus Cristo?
Dizem que Cristo ficou famoso por sua mensagem de amor; outros dizem que ficou famoso por sua morte sofrida; alguns que ele é famoso por ter nascido de concepção divina; outros dizem que ficou famoso, apenas por ser vontade de Deus...
Especulações à parte, a mensagem de amor de Cristo não inovou em nada o que homens como Spartacus, Sakyamuni, Sócrates entre outros morreram para nos deixar... Também não podemos entender que Cristo ficou famoso por ter sido executado através da crucificação, especialmente numa época em que qualquer rebelde preso era condenado a morrer por esse mesmo castigo...
Por outro lado, acho difícil crer que Cristo tenha tido uma concepção mágica, surreal e completamente fora dos padrões naturais, como foi a concepção do herói grego Perseu, ou de Aquiles, ou até mesmo dos remotos imperadores romanos, que se consideravam descendentes de linhagens divinas... Sobre a vontade de deus... tenho cá minhas reservas, pois desde os tempos primordiais do catolicismo, os homens vem entendendo como vontade de Deus muita coisa humana e injusta, especialmente aquelas que não tínhamos como explicar de modo razoável...
Não... Jesus ficou famoso e tornou-se o maior de todos os rebeldes da face da terra quando disse que era o filho do homem e que todos os homens eram seus irmãos! Ah sim... Isso parece por demais trivial hoje em dia... tanto que nem nos importamos com essa verdade, escondida entre as difíceis e intricadas palavras bíblicas e os livros de história.
Mas àquela época, os homens não rezavam diretamente a Deus, pois Deus era visto como um homem de poderes sobrenaturais, igual o Zeus retratado em “Fúria de Titãs”. Como lidar com alguém que tinha poderes mágicos de interferir no rumo de nossas vidas, mas que também estava sujeito ao ódio, ao sentimento de vingança e a toda a sorte de sentimentos humanos?
Pois é... Somente homens de autoridade se arrogavam no direito de se auto intitularem como filhos de deus, como os “césares” romanos, os imperadores chineses e o japoneses... Ser filho de deus, para o populacho daquele tempo, era o mesmo que dizer que sua mãe havia tido relações com um deus... Vejam só!
Imaginem o intenso estado de pânico que as pessoas tinham desse “deus”... Se não déssemos suas esmolas, se não lhe sacrificássemos nossos melhores animais ou lhe déssemos um bom quinhão de nossas colheitas, que mal poderia abater-se sobre nós ou nossa família? Nossas esposas poderiam ficar estéreis; uma geada poderia destruir toda a colheita; as doenças nos atacariam com facilidade... Então, íamos aos templos, queimávamos nossos incensos, fazíamos nossas doações, tudo para que esse deus nos favorecesse...
Quando Cristo revelou ao mundo que era filho do homem e que todos os homens eram seus irmãos, não se colocou na posição de homem-deus... Jesus apenas revelou ao mundo que a divindade maior do universo não era nossa inimiga, mas também não era inimigo daqueles que eram diferentes de nós... Jesus apenas deixou dito que todos, independentemente do modo como nos comportávamos, vivíamos ou das crenças que alimentávamos, éramos (e somos) filhos de um mesmo pai e, como tal, irmãos... Essa, de fato, era a mensagem pela qual valia a pena morrer...
Mas... em nome de Jesus... cristãos mataram pagãos; por descrença em Jesus, pagãos mataram cristãos... Cruzados imolavam mulçumanos, com as bênçãos de muitas autoridades religiosas, que pregavam abertamente que “matar um infiel não era pecado, mas sim a chave para ida ao reino dos céus”... De todos os lados, pagãos, cristãos, mulçumanos, entre outros, matavam-se e cada um invocava a “vontade de deus”... Sem contar a áurea época da Santa Inquisição (que de santa não tinha nada)...
Não me lembro, de modo algum, que Jesus tenha dito que pessoas diferentes deviam ser queimadas vivas... Mas, apenas para que isso não soe como um ataque a essa ou aquela religião, também duvido muito que usar uma burca seja vontade de Alá, ou que matar em nome dele seja um ato religioso... Tudo se resume em invocar a vontade de deus, para justificar a minha vontade... ou pior... invocar a vontade de deus, para justificar o maior de todos os atentados: tirar a liberdade de outras pessoas! Isso, sim, soa demasiadamente humano... e não divino!
O fato é que mais de dois mil anos após a morte de Jesus de Nazaré, a humanidade fez de tudo invocando seu nome, menos por em prática a mensagem universal de que todos somos filhos de Deus e irmãos uns dos outros... Aliás, com todo o respeito... o dogmatismo religioso, em si mesmo, é mais que um entrave à mensagem de Jesus. É um verdadeiro insulto... que vem se arrastando, miseravelmente, por toda história humana...
Portanto, continuo pensando... Quem irá pagar para limpar a imagem de Jesus Cristo? Se a Benetton doou um valor para “desculpar-se” pelo uso “indevido” da imagem do Papa Bento XVI... na minha modesta opinião... alguém deveria doar um “gordo” valor ao mundo inteiro, especialmente àqueles que realmente sofreram ou sofrem em razão do dogmatismo religioso, para remediar o lodo que foi jogado na imagem de Jesus Cristo... e, principalmente, na sua mensagem.

Silva Rumin

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