sábado, 4 de agosto de 2018

A DIVISÃO


Minha vida, sua vida, nossas vidas.
Uma eterna divisão.
O que esperam de nós?
É importante o que esperam?
Seja bom, para ser amado;
honre seus pais;
trabalhe pela justiça no mundo;
seja honesto sempre;
seja gentil e verdadeiro;
honre a Deus, sobre todas as coisas;
vista-se adequadamente;
dê dinheiro aos necessitados;
alimente-se direito;
cuide de seu corpo e sua saúde;
não fume; não beba;
não transe antes de se casar;
esconda sua sexualidade;
case-se, tenha filhos, ame-os;
seja simpático, cordial, pacífico.
Seja, seja, e apenas seja.

Mas se nada disso dá certo?
E se seus pais o abandonam?
E se a bondade aceita é a pusilamidade?
E que justiça devo defender?
A das leis, que beneficia a corrupção,
ou a que clama oportunidades iguais a todos?
Como ser verdadeiro,
em um mundo que cultua a ilusão?
O que é vestir-se adequadamente?
Saia, maquiagem, salto alto,
Mesmo que me incomode?
É traje social, casual ou a nudez completa?
Perdoariam minha nudez,
em um mundo onde minha nudez de mulher,
sempre é objetificada?
E o necessitado?
A quem devo ajudar?
Os que vagam sem espírito ou sem dinheiro?
Pois a corrupção de sonhos e capacidades,
empobrece mais que a falta de dinheiro...
E o que se pode fazer?
Não se dá aquilo que cada um precisa cultivar.
E como ser gentil andando em meio a espinhos?
Como honrar esse Deus, criado pelos homens,
invocado para sustentar nossas diferenças?
Por que não fumar, não beber?
Meu corpo, então, não me pertence?
Onde estavam os guardiões do meu corpo,
quando ele foi violado, maltratado e objetificado?
Qual o sentido dessa moral e dessas regras?
Cobra-se essa conduta social,
pune-se socialmente quem desrespeita.
Fala-se muito, faz-se pouco.
Mas, então, o que dá à sociedade esse direito?
Exige-se um paraíso na terra,
utópico, repleto de beleza, de “normalidade”,
mas que realmente nos mantém na posição inicial...
Meros peões de uma vontade coletiva,
ditadas por aqueles que desejam a continuidade...
Onde há espaço para o amar em sua pureza?
Onde está o espaço para a verdade de cada um?
E por que calamos nossas vozes?
Essa voz interior é uma ameaça?
Ser feliz, verdadeiramente, é ameaçador?
Negar a Deus, as regras opressoras e o poder...
Não há nada mais ameaçador que assumir sua divindade...
E, ainda assim, nos deixamos oprimir.
Medo é mais forte que o desejo de liberdade.
Rouba essências, amores, sonhos...
O medo rouba-nos tudo, até nossa divindade...
Quem precisaria de um deus, quando somos deuses?
Mas esse arremedo de vida, continua seu curso...
Nos coloca constantemente em colisão,
com a verdade que existe em nosso âmago...
E a continuidade, continua...
Minha vida, sua vida, nossas vidas,
Amordaçadas por essa eterna divisão...
 G. P. Silva Rumin


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