quarta-feira, 7 de dezembro de 2011

COLECIONADOR DE SONHOS

O som do despertador acordou-me, precisamente, à seis e meia, como todas as manhãs e, como sempre, desliguei e fiquei na cama, rolando com preguiça de um lado ao outro, pensando em absolutamente tudo e, ao mesmo tempo, em nada específico.
Quando era criança, havia um certo ar de romantismo em ficar na cama pensando. Naquele tempo a vida era como um enorme oceano, cheio de perigos e monstros marinhos a se enfrentar. Mas aí, quando crescemos, notamos que o enorme oceano se torna uma pequena bacia de água e que monstros marinhos, na realidade, não são nada se comparados a seu chefe num dia de fúria.
O fato é que quando se cresce, muita coisa deixa de ter sentido, enquanto outras são fundamentais. Por exemplo, levantar-se todas as manhãs para trabalhar, tem algum sentido, o que não faz sentido algum para uma criança, nem mesmo para aquelas que se vêem obrigadas a trabalhar. Para a criança, no entanto, faz sentido brincar, ao passo que se vemos um adulto brincando, certamente vamos achar tudo absolutamente sem sentido.
Mas nem tudo que fazíamos, quando crianças, para mim tinha sentido. Sei lá... meus amigos colecionavam coisas absurdas... Uma, por exemplo, colecionada nomes de filmes... Não me pergunte a razão, mas isso era seu motivo de orgulho... Incontáveis listas e mais listas de nomes, todas cuidadosamente escritas com canetas coloridas e com cheiro de chiclete, num caderno brochura de capa dura.
Já eu, por exemplo, sempre achei que não pertencia a esse mundo de colecionadores, pois não entendia a razão de se ter pilhas e pilhas de papel de carta, ou de carrinhos em miniatura, ou apenas nomes... Por isso sei que quando rolava na cama, quando criança, nunca pensei em nada disso... Ficava imaginando o futuro das coisas... o meu, o seu, o nosso, os vossos... Talvez eu fosse uma colecionadora de sonhos...
Será que isso é possível?
Papéis de carta, carrinhos e folhas com nome eram possíveis tocar... Podiam até ser trocados na hora do recreio na escola... Mas os sonhos... esses eram somente meus... afinal de contas, não se podia trocar sonhos...
Hoje tentei me lembrar o que fiz dos sonhos que eu colecionava... Confesso que não me lembro... Achei apenas lembrança de frases dos adultos do tipo “Que pena, você poderia ter algo melhor...” ou então “Que pena, você poderia desejar ser algo melhor”, ou até mesmo um “Nossa, e você pensa que vai conseguir isso?”, e fiquei perplexa ao perceber que joguei minha coleção de sonhos fora...
Foi como se tivessem me desnudado diante de uma platéia. Podia até escutar gritos do tipo “Olhá lá aquela pessoa sem sonhos!”, o que, convenhamos, é bem pior do que rirem de você por estar sem roupas... pois com ou sem roupas, você consegue caminhar, mas ninguém consegue chegar a lugar algum sem sonhos!
Chego a conclusão que não foi minha vida que perdeu o sentido... Fui eu quem deixei de fazê-la ter sentido, quando acreditei que não era capaz de um monte de coisas... Pior de tudo foi perceber que ao invés de colecionar sonhos, passei a colecionar apenas recordações dos sonhos que tive. Isso sim não fez sentido algum!
Silva Rumin

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